Na união de techno, funk e brasilidades, Mamba Negra lança seu novo VA "PREGAÇÃO”
- vetormagazine
- 4 days ago
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O novo projeto da MAMBArec traz new faces e veteranos do underground, ou melhor ‘underGRANDE’, para expressarem suas sonoridades e personalidades únicas
Texto e entrevista por Pedro Paulo Furlan

A Mamba Negra, coletivo LGBTQIA+ nascido em 2013, é um dos maiores marcos do underground, ou, como diz Laura Diaz, uma das co-fundadoras, ‘underGRANDE’ brasileiro. Ponto central da música eletrônica alternativa em São Paulo, a Mamba é uma entidade diversificada na cena atual, indo além de uma festa e abraçando as funções de um coletivo político e de uma gravadora, a MAMBArec.
Na última sexta-feira, 18, o selo da Mamba Negra lançou "PREGAÇÃO", seu mais novo VA, sigla para "Various Artists”, um tipo de projeto colaborativo com muitos artistas. Convidando veteranos e new faces, a nova coletânea traz a participação de Clementaum, IDLIBRA, DJ Paranoia, Brunoso, Victin, MC Naninha, Laza, Sykors, GDZ, cybiko2000, Baby ICQ, DJ LHC, Wavezim, DJ “Alyx, K-OH e Africanoise.
“A Mamba é uma prova dos níveis que o underground brasileiro pode chegar, não digo apenas em proporções, em volume, mas em qualidade, originalidade, e fidelidade aos próprios valores. Isso é muito inspirador", aponta o DJ e produtor musical K-OH, originário de Jaraguá do Sul (SC), que fez parte do lineup da Mamba em 2024.
Mesclando dubstep, bass, garage, idm, noise, tribal, techno e funk, sempre com muita brasilidade e personalidade artística, "PREGAÇÃO” chega como uma união da cena atual, expondo as sonoridades de mais de uma dezena de artistas.
“Produzir um VA é um grande desafio, principalmente por envolver a organização e alinhamento de diversos artistas", comenta Victin, produtor executivo de "PREGAÇÃO” e label manager da MAMBArec: “Mas, confesso: é uma das partes que mais gosto no meu trabalho com a label. Reunir talentos distintos e transformar isso em um projeto coeso e significativo, como foi a finalização desse VA, é extremamente gratificante”.
“Acho que o diferencial desse VA pros outros da Mamba é que tem uma pegada muito mais club e atual, trazendo essas novas carinhas da cena, muito fresh", afirma Kontronatura, que foi responsável pela curadoria desse VA junto outro nome grande da noite brasileira, Pininga: “O intuito dele é ser uma grande caixa de ferramentas sonoras do underground brasileiro e que toque muito pelo pistawn do mundo todo".
Celebrando sua presença neste VA, a produtora e DJ recifense IDLIBRA aponta que a MAMBArec é “um selo que tem insistido em sobreviver nesse momento em que o underground está super na corda bamba", destacando a importância deste projeto como um sinal de que temos “mesmo que unir forças para que essas iniciativas underground queer no Brasil possam construir uma rede de sustentabilidade para com seus artistas”.
Com 11 faixas, o VA “PREGAÇÃO” traz uma visão diversificada e completa da cena atual, incluindo desde o techno e as sonoridades eletrônicas mais 'tradicionais’ quanto o funk, que é uma das maiores exportações musicais brasileiras dos últimos anos.
“O mais importante é estar compartilhando esse espaço com pessoas que tenho bastante admiração e estão no percurso comigo", afirma o produtor GDZ, responsável pela faixa "BEAT DE FERRO”: “Com certeza é uma honra estar junto de nomes tão talentosos numa plataforma que tem os mesmos valores que o meu".
“'PREGAÇÃO’ representa o auge da nossa música contemporânea no Brasil — é emergente, simbólica e carrega uma força única que traduz bem o espírito do nosso tempo”, finaliza Victin, sobre o novo VA.
Abaixo, conheça um pouco mais das faixas de "PREGAÇÃO", nas palavras de seus produtores!
ANACRONICO
DJ LHC/Agazero: “A track é uma referência a um fenômeno de quebra de linha do tempo, que em consequência gera o ‘anacronismo’ - ela foi criada pensando no choque de dois lados opostos dos meus projetos: quando Agazero, que representa o futuro, cruza a linha do tempo com DJ LHC, que está no passado.
A faixa começa com o projeto Agazero, com choirs de sintetizadores, e um groove de funk mais atual com elementos modernos, e, ao decorrer dela, entra num buraco de minhoca e cai em 1997 - e o DJ LHC entra em ação, com as referências do Miami Bass e dos primeiros funks montagem cariocas, que são de origem da minha terra natal, São Gonçalo”.
CATUCADA
DJ ALYX: “A minha track é perfurante e desnorteante, feita para dançar e dissociar. De inspirações, dá pra falar do funk ritmado, jersey club, bruxaria, mas na realidade foi tudo natural e espontâneo, é fruto da experimentação mesmo. Poder ter 'CATUCADA’, que é minha contribuição, mesmo que pequena, para esse movimento histórico que é a Mamba Negra, é algo muito gratificante”.
REAL GOOD
DJ Paranoia: “Minha primeira ambição com essa track era criar uma sensação de algo animalesco com o grave e mantendo a bateria com a progressividade que eu esperava de algo que tocaria na Mamba Negra. Uma abordagem bem próxima do que o NOMMOS [duo dos DJs Kontronatura e do Evehive] usam para percussão.
Essa track é uma honra imensa. Ter ido na Mamba foi uma experiência que mudou completamente minha carreira, me permitiu conhecer sonoridades e artistas, me inspirar com outro público, além de me dar um norte diferente".
TAMBOR NO FIM DO MUNDO
Brunoso: “Essa faixa, como o próprio título deixa explícito, tem uma raiz sonora bem forte no tambor de crioula - esse ritmo por si só já traz uma atmosfera e sensação psicodélica. Quis trazer essa loucura traduzida com synth e batidas mais loucas ainda se misturando e remetendo a uma sonoridade futurista pautada no Maranhão. Poder levar esse som com minhas raízes e influências ao lado de outros artistas que admiro muito é incrível".
BEAT DE FERRO
GDZ: “‘BEAT DE FERRO’ começou com uma demo chamada “Desgosto da Sophie”, nem tinha muita forma ainda. Queria fazer remetendo ao trabalho da SOPHIE, usando timbres agudos e metálicos, quase estridentes. Logo enviei pro cybiko e depois pro Sykors, e transformamos essa música numa grande mistura de hardstyle, funk e até do voltmix”.
Sykors: “O processo foi muito divertido porque cada um teve total liberdade de fazer algo que sentia vontade de botar na música, sem querer colocar um padrão ou fazer algo parecido com que já existe, saca? Acompanho a Mamba faz muito tempo, fiquei muito feliz com o convite para participar, realização de um sonho mesmo”.
cybiko2000: “Faço música há uns 4 anos e ainda não sei o que estou fazendo, então ser incluído nessa compilação com essa track tão especial me faz sentir que estou no ‘caminho certo’ e que fiz algo que importa”.
Ó
LAZA: “Essa track é uma colaboração minha com a Clementaum, somos muito amigos e moramos juntos também. Em casa, eu às vezes ficava falando ‘ó’ e a Cle tem uma mania de pegar uma expressão, uma palavra, e repetir ela muitas vezes - e isso começa a pregar na nossa mente, então, eu falava sem ver, sem perceber. Foi uma brincadeira que acabou, de forma orgânica, virando uma música. Temos referências de funk, guaracha, techno, latino club, tem samples, que a gente adora destruir, tem bateção de leque. É uma track que simboliza tanto nossa amizade, minha e da Cle, quanto nossa identidade sonora”.
Clementaum: “Essa track é com o LAZA e a gente tem uma ligação muito grande. Para a nossa criação, eu trouxe os drums mais brasileiros para a música, trouxe os vocais, que tem meus e do RKills. Acho que é uma coisa que é nossa vibe, o que gostamos de transmitir para nossa pista e para o público - que é exatamente nossa maior inspiração. Poder fazer uma música com o meu amigo e poder trazer nossas próprias identidades é muito importante, especialmente para a Mamba que sempre traz novas visões para a cena de música eletrônica underground, tanto no Brasil quanto no mundo".
FREQUÊNCIA DE TOMA
IDLIBRA: “Fiz essa track na minha turnê da Europa no ano passado. A maior parte do tempo em que eu produzi, eu estava voando, onde tinha uma grande presença de um som baixo, e acabou que, não sei se por conta disso, a faixa é uma grande sobreposição de frequências baixas. Tem muito referencial de techno com o funk, mas, dentro de uma atmosfera mais sombria, mais hipnótica, o que, para mim, tem muito a ver com minha memória sonora sobre a Mamba".
BOOM BATUQUE
Wavezim: “Era 2023, poucas semanas antes de eu me apresentar no Festival MADA no Rio Grande do Norte, quando vi que na mesma line-up teria a incrível Margareth Menezes, e ouvindo suas músicas, eu parei na clássica “Dandalunda” e ali sabia que queria samplear aquele trecho do início de alguma maneira. Minha ideia era transformar tudo isso em uma música para as pistas, onde eu conseguisse trazer os elementos originais para o contexto da música eletrônica brasileira atual, com baterias saturadas. Brinco que o resultado final dessa track tem gosto de Carnaval e não poderia ser diferente, tendo Margareth Menezes como ponto de partida".
KWANZA
Africanoise: “‘KWANZA’ foi uma mistura de várias viagens - eu não produzia há um tempo sons mais acelerados, mais ruidosos, e acabei em uma maré que me levou a 7min de track. Por ter bastante percussão, graves, glitchs e o tempo que ela leva, dei o nome KWANZA, que é um rio gigante de Angola”.
NEO-ARAPONGA
K-OH: “A track surgiu de uma preocupação minha de fazer algo que fosse agressivamente brasileiro, mas que não se apoiasse tanto no funk, além da minha vontade de samplear o canto da ave Araponga-da-Amazônia. Outro fator importante foi a obsessão que eu tive com o carnaval de Salvador na época que comecei a produzir, e daí vem a percussão, que é quase toda composta de samples e loops de timbau. Acima de tudo, achava um pecado ninguém nunca ter sampleado algum canto de Araponga, levando em conta a proeminência de agudos e samples de passarinho em produções recentes. Tipo, meu, o pássaro com o canto mais alto do mundo é brasileiro e ninguém vai fazer nada a respeito?".